SérieMorte: The 8 Show - Um Terror Social Leve

Nova série da Netflix, inspirada em uma Webtoon (comum pra plataforma), é absurda de boa, de um jeito incômodo. Trata-se de uma série de terror psicológico e social, que se assemelha um tanto com "Round 6" e o filme "O Poço", mas tem muita coisa que coloca essa série em um patamar acima deles.

É uma obra que causa uma variedade de sentimentos, indo da mais branda alegria pra mais pura raiva, e ela não tem vilões ou mocinhos, apenas protagonistas e antagonistas que revezam em seus papéis.


A série fala da sociedade, de um jeito claustrofóbico, e ainda assim ela segura a atenção, por longos 8 episódios (que fazem alusão ao próprio título do show), brincando com a atenção que conquista e nos causando culpa. Confesso que sinto um gosto estranho na boca, que não sentia a muitos filmes e séries de gênero similar. Aliás, apesar de falarem que é um dorama, mesmo sendo coreana, está longe disso, e pende mais pro terror psicológico mesmo.

Enfim, falarei mais a respeito a seguir e, não se preocupe pois não darei spoilers.

Boa leitura.


Um Show Particular


Quem conhece a série Round 6 sabe bem que esse tipo de programa agrada o público rapidamente, e o sucesso visto lá obviamente seria imitado de alguma forma. Foi o que fizeram com o pseudo live action, e fizeram muito mal.

Mas, "The 8 Show" tem uma pegada diferente mesmo soando parecida. Ele traz personagens sem nome e os identifica por números, coloca em um programa competitivo por dinheiro com algumas regras, e claro, não deixa claro se as coisas irão desandar e caminhar pra violência ou não.


Ainda por cima, tudo tem um tom bem humorado, enquadramentos estranhos, e uma estrutura narrativa com flashbacks e até narração dos pensamentos dos personagens. Isso dá a impressão que é algo leve, e provavelmente não será tão ousado quanto os semelhantes.

Mas é ai que a série nos surpreende, pois suas reviravoltas não dependem de violência forçada, mortes ou conflitos de heróis contra vilões. O negócio é mais pé no chão, baseia-se e inspira-se no crível para apresentar o que as pessoas realmente fariam nas situações que estão.


Tanto que no final, a gente até sente raiva por quem foi mal, e quem foi bom, mas ainda entendemos todos, e concordando ou não com suas atitudes, aceitamos.


Personagens


Citarei apenas o que há de importante neles.

         8         


Uma artista exuberante e mimada.

  7  


Um escritor calculista e perspicaz.

 6 


Um ex-jogador explosivo que honra o que tem entre as pernas.

5


Uma enfermeira psicologicamente perturbada

4


Uma jovem dependente de atenção e aceitação.

3


Um jovem que busca um motivo pra viver.

2


Uma socorrista habilidosa e empática.

1


Um palhaço decidido com uma ideia.


Temas


Tem violência, bastante inclusive, e as coisas vão de 8 a 80 com uma velocidade aceleradíssima. É engraçado que a abertura já adianta que isso ocorrerá, sendo leve e agradável a princípio, e acelerando muito ao ponto de se tornar insuportável mas ainda atrair no final.

A abertura toca "Lonely", que se acelera com imagens abstratas em tela, que vão se distorcendo até tudo queimar. É a série resumida!


No começo tudo é fácil de entender e calmo. Somos apresentados ao sistema no qual a série se ambienta, e o mais interessante é que essa introdução é essencial pra que o cerne do show funcione.

Isso pois, o primeiro episódio mostra com clareza o valor do dinheiro da realidade na qual tudo vai ocorrer. Moedas variam de local pra local, de economia pra economia, e as vezes 1 milhão de alguma moeda pode valer bem mais que 10 bilhões de outra. Assim que explicam tudo, através do cuidado de contarem como o trabalho diário de cada pessoa resultava em um valor X, o qual não supria a necessidade de gastos da vida daquele mesmo individuo, mantendo ele num looping na própria vida: Trabalhar pra viver, viver pra trabalhar.


Algo que é potencializado quando introduzem o jogo em si, e a simplicidade dele, pouco a pouco com suas regras trazidas ao público através dos participantes, é o complemento ideal para impactar nossos sentimentos, com um pouco de alívio aqui, uma pitada de empatia ali, e uma tonelada de revolta e repudia em seguida.

Não são só as cenas tensas e severas que chocam, mas todo o conjunto de ideias sociais aplicadas na prática, e mostradas ali na íntegra, pra que testemunhemos pasmos o resultado óbvio de um convívio forçado.


O Jogo


Do que se trata o tal jogo? Bem, 8 pessoas são convidadas em circunstancias particulares, com limusine e tudo, para um teatro isolado. Lá dentro, sem se encontrarem, uma a uma coletam Cartas com um número de 1 a 8.


A proposta é trocarem o tempo de suas vidas por dinheiro, simples assim, entrando em um reality show cheio de câmeras em todos os cantos, com algumas poucas regras, com tempo limite aparentemente fixo, e que acabaria caso alguém morresse, passando certa segurança.


Quem chega primeiro não importa, afinal cada um escolhe a carta que quiser, pega e passa pelas cortinas do palco. Ao fazer isso, o indivíduo se vê num salão trancado, repleto de objetos cenográficos, com uma escadaria de 8 andares.


Cada andar tem uma porta pra um quarto, e cada jogador com sua respectiva carta deve entrar no quarto, abrir mão de tudo que possui, e usar a roupa que o programa entrega. 


Então, a pessoa deve viver ali, no quarto durante a noite, e com liberdade pra sair durante o dia pro salão e confraternizar com os demais participantes, ganhando dinheiro por cada minuto ali presente.


Claro, novas regras vão sendo descobertas conforme o jogo avança, como por exemplo a impossibilidade de comprar comida, a qual seria providenciada pelo programa diariamente junto de água.

E, tem a mecânica da compra. Dentro do programa, cada jogador pode usar um pouco do dinheiro que obteve pra comprar o que quiser, mas seja o que for que compre, não pode retirar do quarto.


Caso tire, a penalidade seria perda de metade do valor adquirido até então, o que limita as compras de forma individual.

Porém, também dá pra comprar coisas do lado de fora, usando Tempo como dinheiro. O tempo, mostrado num grande relógio, seria debitado de todo mundo caso comprassem qualquer coisa no salão, mas havia vantagens nisso, pois compras feitas no salão poderiam ser levadas pros quartos e tiradas quando quisessem.


Ainda por cima compras feitas no salão são 100 vezes mais baratas que as compras dos quartos. Um item comprado no quarto vinha com uma inflação absurda, pra desestimular esse tipo de compra, enquanto as compras compartilhadas eram mais baratas, mas debitavam justamente o Tempo.

E o Tempo de permanência ali era o que dava dinheiro. Moral da história, todos precisam se unir para fazer o tempo de permanência durar, e o lucro aumentar pra todos, gastando o menos possível.


Conflitos Sociais


E ai está a parte conflitante, pois a série aos poucos revela que a realidade de cada um ali é bem diferente, justamente por causa dos andares em que se instalaram.


Os valores que cada um obtém são diferentes, e apesar de todos ganharem algo, a inveja começa a pairar sobre a cabecinha da galera. Pior ainda é quando algumas características estruturais também contribuem para que quem esteja num determinado andar, tenha vantagens sobre os demais.

Por exemplo, a Comida, é entregue em um andar, e repassada para os demais. Semelhante a proposta do filme "O Poço". Assim da pra imaginar o conflito né? Quem pega primeiro tem que passar pro segundo, e por ai vai, até não sobrar nada pra quem pegar no fim.


Claro que, há inúmeras soluções práticas para que todos tenham condições iguais de sobrevivência ali, mas será que todos estão de acordo com isso? Será que quem está lá no luxo vai abrir mão disso pra favorecer alguém na miséria?

O pior ainda é que a personalidade de cada pessoa contribui muito pra suas ações, mas tudo é tão aleatório que provavelmente, mesmo se as pessoas fossem realocadas em quartos diferentes, o resultado seria o mesmo.

Até porque, ainda há a revelação de como se aumenta o Tempo de permanência, e isso só contribui mais ainda pras intrigas, suspeitas, e disputas.


Uma Ótima Análise Comportamental


O que nos mantém atentos ao show é a montagem dele, como cada detalhe é revelado pouco a pouco, conduzindo pra um clímax inevitável.

Não apelam pra personagens malignos que estão com segredos pré-show, nem inserem eventos secundários para "fomentar intrigas". Tudo apenas flui, naturalmente, e cada pessoa toma decisões que criam consequências, e essas consequências geram o entretenimento.


E tudo é isso, puro entretenimento. 

Quanto mais tempo curtindo o show, mais ele vai durar, pro bem ou pro mal, não importam os números ali sofrendo, o que importa é o sofrimento... pensamento cruel claro, mas é a realidade.

O final mesmo deixa isso claríssimo, com uma cena pós crédito que nos revela que, toda história tem algum fundo de verdade, e seja totalmente fictícia ou não, toda ideia parte de algum lugar.


The 8 Show é inspirado na Webtoon chamada Money Game/Pie Game, mas e a webtoon? No que ela foi inspirada? Um estudo aprofundado do comportamento social alheio? Uma ficção brotada da imaginação de alguém muito criativo? Ou seria a transcrição de algo real?

Gosto de como o show nos faz pensar no fim, e talvez esse gostinho que eu sinta seja resultante desses pensamentos e dúvidas. A vontade de conversar a respeito, falar sobre quais seriam minhas ações ali, e o que penso do futuro da série em si, isso é algo muito bom de sentir.

Aliás, a série nos mostra 8 participantes, mas é interessante mencionar que os quartos deles tem "F" no nome. São os Números F, indo do 1F ao 8F. Ou seja, há outros shows!


Cadê o 1A ao 8A? Como será que foram as experiências neles? Será que houve confitos ainda piores? Ou será que ainda está rolando? Até porque, se tudo for organizado direitinho, pro bem ou pro mal, todo mundo pode viver num sistema assim, pra sempre.

Vale a pena assistir viu.

É isso.

See yah!



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4 Comentários

  1. Parece ser uma série muito boa, espero que ela tenha uma boa repercussão, mas na sua opnião seria legal uma segunda temporada ? Com outros participantes?

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    1. Esse é um tipo de série que da pra fazer muitas temporadas fácil. Nem é preciso investir em explicar o programa, nem é um tipo de "Jogos Vorazes" em que precisam intensificar importância dos participantes pra não perder a graça. Aqui, meio que o legal é ver o comportamento de diferentes micro sociedades.

      Então sim, creio que terá uma segunda temporada e digo mais, aposto que será ainda melhor.

      Basta manterem o roteiro e a forma sutil de contar, sem exageros ou apelos.

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  2. Hmmm muito interessante, confesso que me despertou realmente o interesse!
    Falando nisso já ouviu falar em Rusty lake? Você basicamente está neste hotel de luxo onde deve ser os convidados que são todos animais com formas antropomórficas, tanto que todos tem cabeça de bicho mas vestem roupas e se portam como gente. Uma vez que você entra num quarto de um ou outro você não vai sair até conseguir carne! O choque tá na verdade de onde vem esta carne e a quem você vai servir a mesma...

    E ainda falando em jogo eu cabei de zerar, mais uma vez, há pouco tempo o game "Burnhouse Lane" e devo dizer, que viagem... Desta vez consegui o final ruim. E cara... É doloroso. E curiosamente aquele que é tido como melhor personagem do game é um senhor já bem idoso mas que surpreende e muito! E ainda tem um gato gigante e queimado com uma voz... Que arrepia!

    Por hora tô tentando equilibrar trabalho e as coisas fora dele, sabe? Tentando me manter em dia com aqui com você e outras coisas que afinal amo fazer. O trabalho pesa muito (eu já tenho 7 dias de folga que tão me devendo e um banco de hora bem gordo) mas eu me esforço sempre pra conseguir dar conta de tudo! Tanto que todo dia vejo meu Naruto (hahaha já na parte da guerra ninja) e até Berserk tô lendo, já no cap 191!

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    1. Sua mente é bem ativa sr Marcio, bom isso!!! Espero que consiga a folga em breve para descansar, e poxa, obrigado por me incluir na sua rotina... motiva muito você sabe...

      No meu caso, tenho tempo mas estou com bloqueios criativos intensos, ta feia a situação rs...

      Mas, vou me inspirar em ti e me esforçar mais!

      Já ouvi falar desse Rusty Lake, mas vou conferir... achei interessante...

      E sobre Burnhouse Lane... bizarro...

      Fico feliz em vê-lo e, obrigado de mais por me acompanhar!

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Obrigado de mais por comentar, isso me estimula a continuar.

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