Crítica: Não se Mexa - Correndo sem sair do Lugar


Não se Mexa


Fisgado pela premissa parei um pouco pra assistir, sem grandes expectativas, e não me decepcionei.

"Não se Mexa" é um filme de terror da Netflix, que funciona como um tipo de "terror claustrofóbico invertido". Conta a história de uma vítima paralisada tentando escapar de seu vilão, e ao invés de causar claustrofobia por locais isolados e fechados onde tudo se passaria, ele causa pela incapacidade da protagonista de se mover.

E não sai disso, o filme é 1 hora e meia de uma moça perdendo os movimentos, numa floresta, enquanto um cara maluco quer capturar ela.

Só que apesar da simplicidade do roteiro, ele causa angústia e inquietação, sem nunca ficar exatamente parado.

Enfim, vou falar um pouco sem dar grandes spoilers.

Boa leitura.



O Filme Não é Parado


Não espere um filme cheio de ação e combates, afinal a premissa já deixa bem claro que não vai ter isso, nem teria como. Mas também não significa que ele é lento, repleto de diálogos expositivos e locais parados pois o filme se mexe bem mais que a protagonista.

Dificilmente ele fica em um único enquadramento, e o tempo inteiro conta alguma coisa, mostrando parte do cenário, mudando os ângulos da câmera, avançando como pode para tornar interessante o fato de uma mulher sair se arrastando por aí. 


A história não começa com Iris (Kelsey Asbille) já paralisada, isso acontece progressivamente, o que é explicado naturalmente para o espectador, em diálogos bem encaixados. Mas o curioso é que antes da metade do longa a protagonista já tá totalmente paralisada, e fica a impressão de que não tem mais o que ser contado.


Só que os pequenos eventos derivados do azar do antagonista Richard (Finn Wittrock) vão pavimentando o caminho pra mais e mais história, e no fim, mesmo ele dando voltas, soa como se algo muito maior tivesse acontecido.

Pois na lógica, o filme inteiro se passa em uma pequena parte de uma floresta isolada, mas na prática, a gente vê muita coisa diferente acontecendo, vários ambientes que ganham novos significados pela perspectiva debilitada da protagonista.


O Medo em Desistir


Curioso que no quesito terror, essa vulnerabilidade dela ganha muito mais destaque do jeito que o longa apresenta, pois não é apenas uma moça imóvel, é uma moça imóvel que desistiu da vida, contraditoriamente lutando por ela quando não tem mais opções.

Então nasce uma sensação desconfortável de angústia por ela, pois enquanto entendemos a natureza dos seus desejos originais, sabemos o quão perturbadora é a forma como ela é obrigada a aceitar que não tem mais escolha.


Bem filosófico na realidade, e isso fica na nossa cabeça, o que segura ainda mais a atenção e nos faz torcer por ela, mesmo ela quase não fazendo nada pra merecer isso.

Contudo também vale dizer que a protagonista consegue transmitir o essencial para que sintamos um pouco do seu terror, mesmo que a atriz não seja tão expressiva assim.


Faz parte da personagem não ter muitas emoções, então não é justo cobrar atuações dignas de Oscar só pelos olhares dela, mas fica nítido o esforço dela em pelo menos tentar, com pouco, mostrar o que sente.

O enredo ajuda, afinal aparecem alguns personagens a mais que interagem com a quietude dela, e isso vai servindo de base pra que o filme permaneça firme, dando tensão, aquela falsa impressão de resolução, o que torna as reviravoltas assustadoras numa boa medida.


Impressiona pelo Simples


O mais bizarro é que ele realmente vem com algo tão simples, mas conta algo tão grande em suas entrelinhas que nos deixa aterrorizados. Boa parte da história é mais sobre o que já aconteceu, do que sobre o que está acontecendo.

Temos a parte da protagonista, que se vitimiza após perder o filho e apenas desistiu de tudo, não dando mais valor ao que tem, e aos poucos começa a notar que talvez, valeria mais a pena permanecer lutando e buscando razões pra se manter firme.


Tem também o vilão, um serial killer que não é amador no que está fazendo e já atacou muitas outras mulheres, o que é tremendamente perturbador quando acompanhamos o jeito como ele caça sua vítima. Só que, justamente por uma maré de puro azar, o cara acaba falhando nas ações mais simples, e ele mesmo se prejudica, sendo apenas isso o que causa o prolongamento da história.


Aí tem a dinâmica entre os pesos que cada um deles carrega, pela bagagem de suas vidas. Em poucos momentos em que conversam, eles expõe uma parte do que sentem e na repetição, em situações diferentes, a narrativa vai se criando e tudo ganha mais sentido.

Chega a ser bizarro como o vilão ajuda a vítima a evoluir, mesmo antes de começar a atuar, pois o pouco que ele ensina e compartilha, é o suficiente pra fazer ela a se valorizar mais. Lembrou até o Jigsaw de "Jogos Mortais" e sua filosofia do "Aprenda a valorizar a vida, sofrendo mais do que aguenta", só que aqui é feito involuntariamente.


O encerramento em si, em que a protagonista agradece por tudo que foi feito, é por lado perturbador, mas por outro muito satisfatório, pois acaba mostrando que até nas piores situações, há algo bom pra se tirar.


Conclusão


Por mais parada que a ideia possa soar, ela tem muito a mostrar, e o filme consegue se sair bem nisso.

Ele também não apela tanto pra conclusões absurdas, mesmo que o final soe um pouco forçado, tudo é plenamente justificável. Enquanto a protagonista cresce ao se ver impossibilitada de lutar, o vilão diminui conforme é frustrado pelo acaso.

E nessa balança, é natural testemunhar uma reviravolta em que os que desistiram ganham um fôlego extra, e os que permaneceram lutando do jeito errado pagam caro com as consequências de seus atos.

É um filme legal, não é o melhor que já vi, mas não é uma decepção.

Enfim, é isso.

See yah.

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