CríticaMorte: Bird Box - Barcelona - Melhor que o original

Pela primeira vez eu vi algo que superou o original, mesmo sem ter envolvimento dos diretores, roteiristas ou atores do filme original de 2018, o que é bem raro. Este é um tipo de continuação, mas sem relação direta com os personagens daquele filme, e sim apenas reaproveitando seu universo.


Com um elenco completamente diferente, este filme espanhol dá um rodeio em Hollywood e também dá uma lição de como se continua algo, respeitando material base e aprimorando ele, com um bom roteiro, uma ótima ideia, e uma execução impecável.

Falarei mais sobre o longa a seguir, mas adianto que podem ter alguns spoilers, e caso queira ver antes de ler, esteja a vontade, o filme é um ótimo terror.

Boa leitura.

Quando vi o primeiro trailer de "Bird Box - Barcelona", o preconceito tomou meus olhos. Rapidamente pensei "Jesus, vão globalizar o plágio de 'Lugar Silencioso'", mas rapidamente marquei para ser notificado quando o filme saísse. A razão? Bem, as vezes gosto de arriscar.


Quando comecei a assistir já parei no início pra ouvir no áudio original e, entendo a razão do subtítulo "Barcelona": Era um elenco espanhol, com áudio em espanhol e atores espanhóis, filmado justamente em Barcelona, e dirigido, roteirizado e produzido na Espanha.

A diretora do primeiro filme foi Susanne Bier, com roteiro baseado na obra de Josh Malerman, e escrito por Eric Heisserer. Agora os diretores e roteiristas são Àlex Pastor e David Pastor.

Considerando que Bird Box (2018) foi uma pura obra nos moldes de hollywood, com Sandra Bullock no papel da protagonista, eu já sugeri a mim mesmo que parasse de assistir antes que me arrependesse. Felizmente não ouvi essa voz tão sensata, permaneci me arriscando, e me encantando com a obra de arte que comecei a vislumbrar.


O filme é de terror é claro, e ele não poupa violência e tensão, apesar de nada ser exatamente explícito (tudo é sugerido, tudo ocorre, mas também tudo é cortado na hora certa). O mais interessante nele está em sua perspectiva.

No original testemunhávamos o surgimento de um universo trágico: Uma entidade passou a andar pelo mundo, influenciando todos que a vissem a se matarem. Porém, algumas pessoas passaram a se esconder, outras passaram a se cegar, e algumas poucas viraram fanáticas que ajudavam a entidade a coletar vítimas.


O foco do filme original era mostrar uma mãe protegendo os filhos dessa ameaça, em um mundo pós apocalíptico, privando seus sentidos visuais, enquanto sofria por alucinações, e agressões físicas dos malucos serventes à entidade.

E o terror era esse, não podíamos ver a entidade mas imaginávamos o que ela poderia ser, temíamos por todos que interagiam com a moça pois podiam ser inimigos, e torcíamos pela protagonista para que ela chegasse à um lugar seguro antes que acabasse vendo de mais.


Dessa vez, acompanhamos o lado dos vilões. Desde o começo, o protagonista é também o antagonista, Sebastián (Mario Casas) e assistimos ele caçando vítimas, conquistando a confiança delas, e as entregando de bandeja pra entidade que ele passou a ver.


Mas calma, o filme não sacrifica o mistério do que o ser é, e até amplifica isso, nos fazendo enxergar pelos olhos do protagonista, e junto dele passar a acreditar, suspeitar e por fim duvidar do que vemos. Isso é tão bem feito e elaborado, que no instante em que ele para de ver as coisas, nós também paramos, mesmo que o filme não nos obrigue a isso, e permaneça "mostrando".


Além disso, acredito que seja a primeira vez (que eu me lembre é claro) que um vilão me fez torcer por sua redenção, e acreditar nela mesmo depois de várias atrocidades. E olha que o longa nem apela pra passada de pano e retirada de culpa, pois até o último instante ele ainda é um vilão. Porém, o filme nos faz entendê-lo, e pior ainda: Nos coloca em seu lugar.


Todos somos heróis de nossas próprias histórias, até mesmo quando bancamos o Darth Vader e matamos padawans indefesos. Tudo parte de alguma crença, mesmo quando agimos por pura maldade, temos nossas razões. Nada justifica nossos atos é claro, mas não muda o fato de que é nossa história... e nela nós somos o foco.

Daí somos forçados a andar de mãos dadas com esse homem, um atormentado e perturbado que mata inocentes levando-os ao suicídio e sorrindo com suas mortes. É perturbador de mais, assustador de mais, e isso que é terror!


Falta brutalidade devo mencionar, apesar do filme pegar pesado muitas vezes, ele não mostra nada, só deixa sugerido e nós apenas aceitamos. Mas se tratando de algo com um tema tão mórbido e chocante, ele podia sim ir além, e não foi, o que curiosamente não o prejudicou.

Claro que ameniza os riscos, e passa a ideia de que certos personagens são imunes pelo poder do roteiro (o que é bem triste), mas novamente, isso não prejudica o todo, uma vez que a tensão persiste, e insiste em comparecer pra nos atormentar.


Todos os coadjuvantes acabam pedindo pra que torçamos por eles, e seus finais sempre são impactantes, alguns muito mais que outros, mas servem todos pra engrandecer as ações do vilão, e nos fazer teme-lo, e temer sua presença rente aos novos grupos que encontra. 

E tudo isso funciona, essa fórmula de mostrar tudo pelos olhos do mal, é muito funcional em um projeto desse tipo. Melhor ainda: Até o que não é mostrado, acaba revelado pela perspectiva dele, e ajuda na construção dele.


E mesmo fora do personagem, ainda há esse vasto universo repleto de dúvidas, mistérios e pura carnificina auto induzida. E isso fica maior, muito maior, pois não temos aquele clássico retorno de personagens conhecidos para repetir fórmulas, aqui temos algo novo, num ambiente diferente, mas em um universo em comum, afinal o mundo é um só.


Belo acerto este, e foi sustentado pela eficiência dos envolvidos. Efeitos especiais não contam muito nessa obra (os cortes rápidos ajudam nisso, e o monstro que ninguém pode ver também), mas as cenas que arriscam, tem um bom resultado.


As atuações puxam nossa empatia, e não são nada artificiais. Até há mescla de idiomas (e não é inglês e espanhol, e sim alemão), com direito ao protagonista conversando nesse idioma, com uma criança nativa.

A jornada do herói é sem esperança nenhuma, afinal não há nada pra se salvar, nem qualquer destino seguro. Tudo só vai do mal ao pior, e sabemos disso pois estamos do lado do cara que tá espalhando o terror. Mas essa esperança vai surgindo, mesclada ao pânico, conforme o filme chega em seu clímax.


Eu esperava um final mais terrível, mas não posso reclamar, porém é o ponto fraco do filme.

Ele não erra em seu desfecho, mas acaba querendo explicar de mais, e nessas horas sofre pelo excesso. Tudo podia acabar de forma vaga e bastaria. Mas ele insiste em fazer hora extra e desperdiça seus últimos minutos.


Há até um alerta de planos de continuação, mas partindo da premissa errada e totalmente oposta a tudo que foi mostrado aqui. Não quero dar spoilers mas, o finalzinho é uma tremenda de uma estupidez clichê que ainda por cima vai contra tudo o que o filme construiu.


Mesmo assim, isso não desqualifica toda a construção. É como visitar um belo castelo feito de mármore, com escadas de ouro, jardins fabulosos, uma sala de jantar grande e farta com todo tipo de pratos dos mais finos e refinados, e dezenas de quartos perfeitamente mobiliados. Porém, o único banheiro fica do lado de fora, feito de madeira e sem vaso, com moscas voando e totalmente insalubre. Se lembrarmos que só estamos de passagem, é só aproveitar a estadia temporária e deixar pra usar o banheiro em casa mesmo.


Metáfora maluca né? Mas entenda como quiser!!! 

E assista, caso queria confirmar se compensa (e eu repito, compensa), por favor assista e me diga o que achou.

É isso.

Obrigado pela leitura.

See yah!

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2 Comentários

  1. Tá aí, achei interessante. O de 2018 eu sofri de um problema que já falei anteriormente, eu li o livro! Infelizmente ler a obra original sempre deixa as adaptações meio sem sal, e li ele muito antes de sequer falarem em adaptar. O livro passa uma sensação que nunca senti em nenhum filme, as cenas eram tão bem descritas que eu largava o livro e saía inconscientemente com o olhar baixo kkkk como se fosse ver alguma coisa. E o filme apesar de não ser ruim, não chegou a me causar sensação parecida. Esses dias vi um filme chamado "a queda" que me deu uma sensação de acrofobia absurda, acho que era algo semelhante que eu esperava de bird box, que me despertasse um pouco do sentimento que eu havia sentido, mas a expectativa é uma esperança ingrata. Porém, a ideia desse mundo é incrível, fazer um filme que de certa forma desvincula da original e apenas aproveita o mundo que foi criado pra mim é uma ideia genial, porque assim eu não tenho expectativa nenhuma, não sei o que esperar e não tenho o que julgar kkkk achei ótimo, acho realmente que esse finalzinho aí não precisava, tenho até medo do que vão fazer com isso, mas o resto não posso reclamar, aproveitei super bem a história, também recomendo aos demais.
    Abraço.

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    1. Curioso, eu sempre me impressiono com a capacidade dos livros em despertarem sensações e a imaginação de forma tão vasta. Sempre que tu menciona algo do tipo, sinto vontade de partir pra leitura em imediato.

      Sr Ed, bom saber que também curtiu, as vezes tenho certo receio dos meus gostos, ainda mais quando é algo que tem alguma obra prévia de algum jeito.

      E de fato, normalmente eu sou contra troca de atores, diretores e tal, meio que destoar do original nem sempre é uma boa ideia. Mas nesse caso eles fizeram direitinho. Respeitaram a obra original e não estragaram nenhum conceito... por enquanto né.

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